sábado, 2 de novembro de 2013

E a alface não sofre? (Sônia T. Felipe) 
Há vinte e dois anos, desde que introduzi a ética animal no mundo acadêmico brasileiro, tenho levado a efeito mais de uma centena de debates sobre a consciência, a sensibilidade, as emoções, as necessidades e os interesses dos animais não-humanos. 

Nessas mais de duas décadas, invariavelmente, duas questões são postas seriamente por alguém presente à palestra, à conferência ou ao debate: e a alface não sofre? e, se temos caninos, como não devemos comer carnes?

Caninos? Mostre-me os seus. Sorrindo, a pessoa põe seu dedo indicador sobre aquele dente que chamamos canino. Esse é um canino mesmo? Tem certeza? Eu esperava seu sorriso vampiresco para poder ver finalmente seus caninos. O que vejo aí é um dente com nome de canino e nenhuma função genuinamente canina. Duvida do que digo? Então sai lá fora, agarra um animal qualquer com esses dois caninos e tira um pedaço. Se conseguir a façanha sem usar arma alguma, está autorizado a continuar a caçar com seus caninos, repito, sem uso algum de armas ou ardis, porque é assim que os animais carnívoros, os que têm reais caninos têm que assegurar sua subsistência...

Quanto à dor da alface, realmente me comove muito. Se tem tanta compaixão pela alface, então está na hora de parar de comer carnes e laticínios. Como assim? Assim, ó: para ter carnes e laticínios no seu prato e no prato de todos os onívoros do mundo, mais de 70% das plantas cultivadas ao redor do planeta tiveram que ser mortas para dar de comer ao gado, que foi morto em seguida para você ter seus bifes, ou forçado a ingerir mais do que deveria para você poder ter laticínios. Quem tem pena de planta para de comer carnes e laticínios, porque juntos são os dois alimentos mais devoradores desses seres tão sensíveis.

Eu tenho compaixão pelos animais, por isso parei de comer definitivamente carnes há mais de vinte anos e definitivamente derivados delas ou leite de fêmeas (sim, tenho que especificar porque há os leites veganos, vegetais puros) e derivados dele há quase quinze anos. Enfim, tornei-me vegana e com isso deixei de matar tantas plantas que antes eram mortas para virar comida para as vacas, as galinhas, as porcas, as ovelhas, as cabras, as peruas e todos os machos dessas espécies que comem vorazmente o que se cultiva de plantas ao redor do planeta. Tenho compaixão pelos animais. Com isso poupo da morte muita planta. Mais refinada que essa dieta abolicionista vegana, somente quando me tornar um ser de pura luz. Espero fazer logo essa transição. Quem sabe?!?

quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Krishnamurti — Sobre a crença em Deus

Pergunta: A crença em Deus foi sempre poderoso incentivo para uma vida melhor. Por que negais a Deus? Por que não procurais reanimar a fé do homem na ideia de Deus?

krishnamurti: Consideremos este problema com amplitude e de maneira inteligente. Eu não nego Deus; seria absurdo fazê-lo. Só o homem que não conhece a realidade se entretém com palavras sem significação. O homem que diz que sabe, não sabe. O homem que conhece a realidade, momento por momento, não tem meios de comunicar essa realidade. A crença é negação da verdade, a crença é um obstáculo à verdade; crer em Deus não é achar a Deus. Nem o crente nem o descrente acharão a Deus. Porque a realidade é o desconhecido, e vossa crença ou descrença do desconhecido é simples autoprojeção, e por conseguinte não é real. Sei que credes e sei que isso tem muito pouca significação na vossa vida. Há muitas pessoas que crêem; milhões crêem em Deus e encontram consolo nisso. Em primeiro lugar, por que credes? Credes porque isso vos dá satisfação, consolo, esperança, e dizeis que essas coisas dão sentido à vida. Na realidade, vossa crença tem muito pouca significação, porque credes e explorais.
Credes e matais, credes em um Deus universal e vos assassinais mutuamente. O rico também crê em Deus; explora impiedosamente, acumula dinheiro, e depois manda construir uma igreja ou se torna filantropo.

Os homens que lançaram a bomba atômica sobre Hiroxima disseram que Deus os acompanhava; os que voavam da Inglaterra para destruir a Alemanha, diziam que Deus era seu co-piloto. Os ditadores, os primeiros ministros, os generais, os presidentes, todos falam de Deus e têm fé imensa em Deus. Estão prestando algum serviço tornando melhor a vida do homem? As mesmas pessoas que dizem crer em Deus, devastaram a metade do mundo, e o deixaram em completa miséria. A intolerância religiosa, dividindo os homens em fiéis e infiéis, conduz a guerras religiosas. Isso mostra nosso estranho senso político.

A crença em Deus é "poderoso incentivo para uma vida melhor" ? Por que precisais de um incentivo para viver melhor? Ora, por certo, vosso incentivo deve ser vosso próprio desejo de viver com pureza e simplicidade, não achais? Se conferis tanta importância ao incentivo, não estais interessado em tornar a vida possível para todos: estais interessado unicamente no vosso in­centivo, que é diferente do meu incentivo — e brigaremos por causa dos nossos incentivos. Se vivemos felizes e unidos, não porque cremos em Deus, mas porque somos humanos, compartilharemos os diferentes meios de produção, a fim de produzirmos, para todos, as coisas necessárias. Em virtude da nossa falta de inteligência, aceitamos a ideia de uma superinteligênda, a que chamamos Deus; mas esse Deus, essa superinteligência, não nos dará uma vida melhor. O que conduz a uma vida melhor é a Inteligência; e não pode haver inteligência se há crenças, se há divisões de classes, se os meios de produção se encontram nas mãos de poucos, se há nacionalidades isoladas e governos soberanos. Tudo isso indica, por certo, evidente falta de inteligência, e é isso que nos está privando de uma vida melhor, e não a falta de crença em Deus.

Todos vós credes, de diferentes maneiras, mas vossa crença não tem realidade alguma. A realidade é o que sois, o que fazeis, o que pensais, e vossa crença em Deus é apenas uma fuga do vosso viver monótono, estúpido, e cruel. Além disso, a crença, invariavelmente, separa os homens: temos o hinduísta, o budista, o cristão, o comunista, o capitalista, etc. A crença, a ideia, divide, não une os homens. Será possível unir certo número de pessoas em um grupo, mas este grupo se oporá a outro grupo. Ideias e crenças nunca são unificadoras, ao contrário, são fatores de desavença, desintegração e ruína. Por conseguinte, vossa crença em Deus só está, na verdade, espalhando misérias pelo mundo. Ainda que vos tenha trazido momentâneo conforto, na realidade ela trouxe mais sofrimentos e mais destruição, sob a forma de guerras, fome, divisões de classe, e as crueldades de certos indivíduos. Vossa crença, pois, é sem eficácia. Se deveras crêsseis em Deus, se isso fosse uma experiência real, vossos semblantes irradiariam afeto, e não estaríeis destruindo vossos semelhantes.

Mas, que é a realidade, que é Deus? Deus não é a palavra; a palavra não é a coisa. Para conhecer aquilo que é imensurável, independente do tempo, a mente deve estar livre do tempo, o que significa que deve estar livre de todo pensamento, de todas as ideias relativas a Deus. Que sabeis de Deus ou da verdade? De fato nada sabeis daquela realidade. O que conheceis são só palavras, experiências de outrem, ou alguns momentos de experiências um tanto vagas, de vós mesmos. Isso, naturalmente, não é Deus, não é a realidade, não está fora da esfera do tempo. Para conhecer o que está além do tempo, é preciso compreender o processo do tempo, sendo o tempo pensamento, processo de "vir a ser", acumulação de conhecimentos. Aí está todo o fundo que constitui a mente; a mente, ela própria, é o fundo, consciente e inconscientemente, coletiva e individualmente. A mente, por conseguinte, deve estar livre do conhecido, o que significa que deve estar de todo silenciosa, sem ter sido posta em silêncio. A mente que alcança o silêncio como resultado, como consequência de determinada ação, exercício, disciplina, não é mente silenciosa. A mente que é constrangida, controlada, moldada, posta numa forma e obrigada a ficar quieta, não é mente tranquila. Podeis conseguir, por certo período de tempo, forçar a mente a um silêncio superficial, mas essa mente não é tranquila. A tranquidade só pode vir quando se compreende todo o processo de pensamento, porque, compreender o processo é pôr-lhe fim, e o fim do processo de pensamento é o começo do silêncio.

Só quando a mente se acha em silêncio completo, não só na superfície, mas no fundo, de ponta a ponta, tanto nos níveis superficiais como nos níveis mais profundos da consciência — só então pode o desconhecido manifestar-se na existência. O desconhecido não é passível de ser experimentado pela mente; só o silêncio pode ser experimentado; nada mais senão o silêncio. Se a mente experimenta algo que não seja silêncio, está apenas projetando seus próprios desejos e portanto não está em silêncio; enquanto a mente não está silenciosa, enquanto o pensamento, sob qualquer forma, consciente ou inconsciente, se acha em movimento, não pode haver silêncio. Silêncio é liberdade, é estar livre do passado, do saber, da memória, tanto consciente como inconsci ente. Quando a mente está silenciosa de todo, quando não está em uso, quando há o silêncio que não é produto de esforço, só então se manifesta o atemporal, o eterno. Esse estado não é um es tado de lembrança; não há nele entidade que se recorda, que ex perimenta.

Por consequência, Deus ou a verdade — ou como quiserdes chamá-lo — é algo que se manifesta de momento a momento, e isso só pode acontecer num estado de liberdade e espontaneidade, e não quando a mente foi disciplinada, de acordo com uma pa drão. Deus não é produto da mente, não é resultado de autoprojeção; só pode surgir quando há virtude, que é liberdade. Virtude é enfrentar o fato, o que é. E enfrentar o fato é um estado de bem-aventurança. Só quando a mente está repleta de felicidade, tranquila, imóvel, sem nenhuma projeção de pensamento, cons ciente ou inconsciente — só então se manifesta o Eterno.

Krishnamurti
A Primeira e Última Liberdade
Esteja presente como o observador da sua mente - de seus pensamentos e emoções, bem como suas reações em várias situações. Seja pelo menos tão interessado em suas reações como na situação ou pessoa que faz você reagir.

Observe também quantas vezes sua atenção está no passado ou no futuro. Não julgue ou analise o que você observa.

Assista o pensamento, a emoção, observe a reação. Não os torne um problema pessoal. Então você vai sentir algo mais poderoso do que qualquer uma dessas coisas que você observa: a presença observadora imóvel, por trás do conteúdo da sua mente, o observador silencioso."

~ Eckhart Tolle
O apego invariavelmente produz medo.

A pessoa pode ter um dom particular, como um músico, que é tremendamente apegado a seu instrumento ou ao cultivo de sua voz. E quando o instrumento ou a voz falha, ele fica completamente perdido, seus dias acabaram. Ele pode pôr no seguro suas mãos ou seu violino, ou pode se tornar maestro, mas ele sabe pelo apego que a inevitável escuridão do medo está esperando. Pergunto se cada um de nós – se somos realmente sérios – examinou esta questão, porque liberdade significa liberdade de todo o apego e, portanto, de toda dependência. Uma mente que está apegada não é objetiva, clara, não pode pensar sensatamente e observar diretamente.

- J.Krishnamurti -

The Impossible Question Part II Chapter 3

http://www.jkrishnamurti.org/pt/krishnamurti-teachings/view-daily-quote/20120914.php
 


A ocupação da mente.

Por favor, ouça calmamente: sabemos que o pensamento produz medo. Uma das funções do pensamento é estar ocupado, estar pensando alguma coisa o tempo todo. Como a dona de casa que pensa na comida, nas crianças, na limpeza – essa é toda sua ocupação; tire essa ocupação, e ela ficará perdida, se sentirá totalmente desconfortável, solitária, infeliz. Ou tire o Deus do homem que adora Deus, que está ocupado com Deus; ele ficará totalmente perdido. Assim, o pensamento deve ficar ocupado com uma coisa ou outra, ou com ele mesmo ou com política, ou em como criar um mundo diferente, uma ideologia diferente e assim por diante; a mente tem que estar ocupada. E a maioria de nós quer estar ocupada; de outra forma nos sentiríamos perdidos, de outra forma não sabemos o que fazer, estaremos sozinhos, seremos confrontados com o que realmente somos. Compreende? Então você fica ocupado, o pensamento fica ocupado – o que impede você de olhar para si mesmo, para o que você realmente é.

- J.Krishnamurti -

Bombay 1st Public Talk 19th February 1967

http://www.jkrishnamurti.org/pt/krishnamurti-teachings/view-daily-quote/20120915.php
 
A sociedade é para o indivíduo, ou o indivíduo é para a sociedade?

Um problema se oferece à maioria de nós: se o indivíduo é simples instrumento ou fim da sociedade. Vós e eu, como indivíduos, existiremos para sermos utilizados, dirigidos,educados, controlados, ajustados a um certo padrão pela sociedade e pelo governo, ou a sociedade, o Estado, existirão para o indivíduo? O indivíduo é o fim da sociedade; ou apenas um fantoche, que existe para ser ensinado, explorado, massacrado como instrumento de guerra? Eis o problema que está nos desafiando. É o problema do mundo: se o indivíduo é mero instrumento da sociedade, um brinquedo à mercê de influências, pelas quais é moldado, ou se a sociedade existe para o indivíduo.

(...) Se o indivíduo é mero instrumento da sociedade, a sociedade, nesse caso, é muito mais importante que o indivíduo. A ser verdadeira tal afirmação, o que devemos fazer, então, é abandonar a individualidade e trabalhar para a sociedade; todo o nosso sistema educativo terá de ser revolucionado de alto a baixo e o indivíduo convertido num instrumento para ser usado e destruído, liquidado, eliminado. Mas, se a sociedade existe para o indivíduo, a função da sociedade não é então obriga-lo a ajustar-se a um padrão e sim dar-lhe o senso de liberdade, o impulso para a liberdade. Cumpre-nos, pois, averiguar qual das duas é falsa.

(...) Para se achar a verdade relativa a esta questão, é preciso estarmos livres de tudo quanto é propaganda, o que significa estarmos habilitados a estudar o problema independente da opinião. A tarefa da educação se cifra, toda ela, no despertar do indivíduo. Pra perceberdes tal verdade, precisais estar perfeitamente lúcidos, isto é, não deveis depender de guia algum. Quando escolheis um guia, o fazeis porque estais em confusão, e portanto, vossos guias acham-se também confusos, como estamos vendo acontecer no mundo. Consequentemente não podeis esperar orientação ou ajuda de vosso guia.

Krishnamurti —A primeira e última liberdade

Texto completo:http://nossaluzinterior.blogspot.com.br/2013/02/a-sociedade-e-para-o-individuo-ou-o.html
 
Onde há o seguir, há medo.

Se um homem deseja obedecer e seguir a um outro, ninguém o pode impedir; porém é o superlativo da falta de inteligência e leva a grande infelicidade e frustração.

Se aqueles de vocês que estão me ouvindo, começarem a pensar real e profundamente a respeito da autoridade, não mais seguirão a ninguém, inclusive a mim mesmo. Como disse, porém, é muito mais fácil seguir e imitar do que, realmente, libertar o pensamento da limitação do medo, e bem assim, da compulsão e da autoridade.

Krishnamurti — O medo — 1946 — ICK

http://nossaluzinterior.blogspot.com.br/2013/04/onde-ha-o-seguir-ha-medo.html